quinta-feira, 6 de agosto de 2009

A Razão sem razão.


Não existe verdade absoluta, existem sim circunstancialismos que parecem adequar as verdades tidas como absolutas, aos momentos em que parecem fazer sentido.
Isto levanta um enorme problema, será que mentimos inconscientemente ou será que receamos que as verdades que nos assolam o consciente, e que nos parecem pouco razoáveis, nos amedrontam?
Necessariamente isto faz parte de um comportamento tido como racional e de bom senso, enquadrado no senso comum e tido como correcto, o que torna as verdades, ou não verdades, como manifestações secundárias desse comportamento, ou seja, obtendo o resultado mais equilibrado logo essa verdade é tida como absoluta e necessária, gera o equilíbrio pretendido.
Tudo isto faria sentido numa postura de "razão pura", contudo não é certo que a afirmação introdutória (não existe verdade absoluta) ou a "razão pura" sejam afirmações correctas e tidas como manifestações do razoável, elas podem ser em si mesmo, e como manifestações que conduzem a caminhos idênticos, sofismas, logo, fruto do circunstancialismo e prova de que não passámos do mito para a razão como se tivéssemos transposto uma sebe e apareceu o país das maravilhas da Alice - passe a ironia - aqui não na versão de fantasia, mas tudo transformado na premissa cartesiana "cogito ergo sum".
Tudo isto parece aborrecido e não servir para nada, então para quê perder tempo com pensamentos que na prática resultam inócuos? Para quê milhares de livros e pensadores ao longo da existência humana? Afinal o resultado, trocado por miúdos, é nada.
Hoje queremos é chegar a casa ligar a TV com ecrã de plasma ou plano, e mudar de canal….. e que horror…….. quando dão as crianças a morrer de fome num qualquer país longínquo.
Aliás banaliza-se tanto a miséria e a desgraça alheia que por vezes temos dificuldade em distinguir a realidade da fantasia, será real ou é algum filme bem realizado, no fundo o resultado é o mesmo, tanto faz, é entretenimento para as sociedades ditas modernas e desenvolvidas.
O cruel disto é que foi "a razão pura" que nos levou a esta postura, ou seja, surge aqui um paradoxo, afinal o pensamento serviu para alguma coisa, a questão é saber se ele hoje é puro ou impuro por estar deturpado e manipulado para motivar as tropas a marcharem todas no mesmo sentido? Como seria bom conhecer a resposta mas é presunção (e água benta) ir tão longe!
Serve isto para quê? Para, tentar, demonstrar que o racionalismo nos levou para a clonização, não genética mas comportamental.
Hoje, quase, todos se comportam segundo parâmetros pré-defenidos, é fácil aos gurus da economia-mercantilista adivinhar o que se vai seguir, qual o carro que vai agradar, qual a roupa que se vai vestir ou os alimentos que se vão consumir e, assim, produzir na proporção necessária e com custos reduzidos e com garantia de escoamento total.
Criou-se o homem "estatísticus" (ser que se enquadra em todas as estatísticas possíveis ao ponto de não ser necessário votar, pois o sentido do voto já é conhecido por essa ciência oculta a que se dá o nome de sondagem/estatística) faz-se as contas, volta-se a trocar por miúdos, e eles compram de certeza.
Porque não são eles que pensam, somos nós os insondáveis homens das estatísticas, coadjuvados por esses seres iluminados da publicidade e que lhes impingem o que queremos.
As necessidades deles são primeiro as nossas necessidades, cultivamos o individualismo, cada um "per si", o homem de sucesso, mas paradoxo dos paradoxos todos iguais.
A que leva isto? Ao abandono do emotivo, das emoções, quase tidas como hereges, o general (o cérebro) não pode dar sinal de fraco perante os seus soldados (aqui os sentidos) tem que ser firme e destituído de emoções.
Perdeu-se o romantismo o ser emocional que também utiliza a razão na proporção necessária. O romantismo que hoje existe só existe se for com reservas, a pureza do conceito dilui-se na amálgama de conceitos tidos como certos, provenientes desse poderoso modelo a "rácio domines".
Felizmente que o quadro não é desesperante, resta a esperança de que em cada um de nós e em todos nós permaneça uma resquício de emoção e se lembrem que como disse, Victor Hugo “só o amor é verdade”

José Garrido – 6 de Agosto de 2009