segunda-feira, 21 de setembro de 2009

O baile popular manifestação do simples.


O óleo fervilha aguardando a massa enrolada que transforma em fartura. O cheiro inunda o recinto….olha a bela fartura, o Chico das farturas faz a publicidade possível, neons enfeitam a rulote , anunciando a fartura e o churro como especialidade. O homem dos balões sopra e chocalha o balão tentando cativar as crianças , e estas num apelo quase desesperado…..pai, mãe compra-me um balão………Soa a música, dedicada a uma musa cigana, diz o cantor num tom popular ,” e ela põe a mão na centura”. Casais mais velhos e mais novos atacam a pista feita na calçada do passeio…..algumas mulheres dançam juntas.
O grupo musical prossegue a sua senda, indiferente aos piropos ou até ao bêbado que num ritmo confuso se estatela no chão quando tenta uma pirueta mais arriscada. Coscuvilha-se atentamente, em tom de troça, alguns….. outros na critica ao pé mal colocado ou ás calças mais justas e transparentes de alguma dançarina….olha o decote, parece que as mamas vão saltar para fora…….que vergonha, elas querem é mostrar-se! Diz alguém alicerçando a sua autoridade na qualidade de decano da festa.
Reza a história que nos Santos Populares, a rua se faz salão dos pobres. Não se veda a entrada porque seriam os Santos os primeiros a criticar a selectividade.
De forma genuína as pessoas reagem ao som da música que de cariz popular, hoje apenas tem tom quase monocórdico que faz as delicias de todos, utilizando para tal a letra brejeira , num mesmo som confundem-se todas as letras…ou se calhar não , depende do ponto de vista e nada me diz que estou totalmente isento ou suficientemente distante para não cair na selectividade que me trouxe esta pretensa cultura ou este manancial de informação que acumulei ao longo dos livros, jornais ou revistas que li.
Confesso que aprecio este tipo de coisa, manifestações genuínas e populares, por contraposição aquela cultura enlatada e vendida aos magotes como pretensamente sinal de bom gosto e sabedoria.
Tenho uma queda especial pelo que é simples. Esta tendência deve-se a que tenho como certo que o que é simples demorou muito mais para atingir tal estado, do que aquilo que aparenta ser complexo, considero até que este último (o aparente complexo) é um simples incompleto.
Ver a simplicidade acarreta uma visão muito mais ampla, mas o “perigo” é considerar a simplicidade como algo que é fácil que não dá trabalho ou até que não tem conteúdo….esse é o erro dos ignorantes e complexos.
A complexidade é uma manifestação da impossibilidade de desmontar algo e torná-lo simples, não é ignorância, nada disso. Representa, isso sim, o processo para a simplicidade, o percurso para se atingir a tal simplicidade que depois de desmontada se torna, quase inevitavelmente, numa aquisição por todos e para todos, eliminando o processo selectivo, mas discernir que existe simplicidade acarreta um mais amplo alcance.
Um diamante vale muito, porque é raro dizem. Num deserto se confrontados com a imensidão e a necessidade de vencer o espaço dois homens carregassem, um diamantes e o outro água, em poucos dias se alteraria a ordem quantas diamantes seriam precisos para um copo de água, e será que valiam ou serviriam para alguma coisa?


“As coisas simples dizem-se depressa, tão depressa que nem conseguimos que as ouçam. As coisas simples murmuram-se, um murmúrio tão baixo que não chega aos ouvidos de ninguém. As coisas simples escorrem pela prateleira da loja, tão ao de leve que ninguém as compra. As coisas simples flutuam como vento, tão alto, que não se vêm. São assim as coisas simples: tão simples como o sol que bate nos teus olhos, para que os feches, e as coisas simples passem como sombra sobre as tuas pálpebras.”
Nuno Júdice